A partir de agora, todos nus

A grande imprensa anuncia de forma triunfal que os artistas capitularam. Desistiram de postular a obrigatoriedade de autorização prévia para que pretensos biógrafos escrevam sobre suas vidas privadas baseados em versões de terceiros. Caetano, Chico, Gil, Djavan, Roberto e Erasmo, entre outros membros do grupo Procure Saber, vão continuar a ter que ir aos tribunais se não gostarem do que está sendo publicado sobre eles.

A guerra com a mídia foi pesada como mostrou a entrevista que Roberto Carlos deu a um programa dominical de TV. Segundo a colunista Sonia Racy, do Estado de S. Paulo, o Rei ficou chateado com a edição que fizeram de suas declarações, suprimindo deliberadamente três pontos que ele julgava fundamentais. E olhe que trata-se de um artista exclusivo da emissora...

Brigar com os donos dos meios de comunicação de massa nunca foi a desses artistas, com exceção de Chico Buarque numa determinada época. Se o black bloc Tim Maia ainda estivesse vivo, talvez essa queda de braço tivesse sido mais dura. Seria um vozeirão a mais contra a exposição não autorizada da intimidade, sobre a qual, pela lei, todo cidadão tem pleno direito.

Com a amarelada do grupo Procure Saber, fica então valendo aquele argumento de que, se os artistas precisam da mídia e do público para ganhar a vida, que entreguem de mão beijada sua privacidade. Os incomodados que reclamem nos tribunais.

Acho que na prática, todos eles colocarão seus advogados para agir assim que souberem que tem gente escarafunchando suas vidas particulares a pretexto de "contar a História do Brasil". Se é isso que o biógrafo quer, que escreva sobre suas carreiras, não sobre suas brigas conjugais ouvidas por vizinhos de ouvido colado na parede.

Eu, de minha parte, continuo acreditando que somos donos da nossa intimidade e que esse direito individual se sobrepõe à muitas vezes tirânica, e conveniente apenas para alguns, "liberdade de expressão". Afinal, leis só existem porque bom senso é um artigo raríssimo no mercado.



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Comentários

  1. Se o Tim Maia e o Raul Seixas ainda estivessem entre nós, eu adoraria ouvir o que eles teriam a dizer sobre o assunto.
    A pior invasão de privacidade fazem as revistas de fofocas que as grandes editoras e alguns canais de tv e jornais vendem diariamente nas bancas.

    Cury

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  2. Se a justiça é lenta e falha, sou radicalmente favorável à obrigatoriedade de autorização prévia.Não vejo a menor importância na vida pessoal do artista. Privacidade é essencial que o ser humano preserve...e não vejo motivo algum para ser jogada como ração aos porcos com fome insaciável por fofocas.

    Dos artistas só interessa-me a arte que eles fazem . Na verdade, poucos são verdadeiros artistas, na minha desimportante conceituação e somente a arte deles interessa-me. Tanto é verdade que nunca comprei um livro sequer ...de biografias(tampouco li), por considerá-los absolutamente dispensáveis. Meu tempo é escasso...tempus fugit.Ato contínuo, só tenho tempo para o essencial...que é a obra do verdadeiro artista, marrelógico..

    Jamais a biografia de uma Clarice Lispector ou de um Fernando Pessoa (para ficar somente em dois exemplos exponenciais) chegará aos pés das extraordinárias ou geniais obras literárias que eles deixaram para a posteridade. Enquanto houver vida inteligente no planeta, eternamente eles estarão "vivos", pois venceram a morte através das suas enfeitiçadas ou iluminadas letras. Aliás, sem a verdadeira arte, não sei o que seria de mim, que sou, dela, um adicto com convicção íntima.
    P.S. meus respeitos aos adoradores de biografias.

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